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Voz do Mouchão



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A tradição da censura

Por vício, tradição, ou fatalismo, habituámo-nos a engolir e a não refilar. A “censura” está a impor-se a vários níveis, e não só na comunicação social. Por aqui, inclusive neste insignificante burgo, nas fraldas da serra, vive-se literalmente de invejas. O importante não é eu estar bem, o essencial é que o meu vizinho não esteja tão bem quanto eu. Ele há quem chame a isto, pragmatismo



Parafraseando um digníssimo professor de jornalismo, pessoa que mantém actualizado um site on-line, onde circunstancialmente são abordadas algumas das questões que tolhem o exercício da profissão em Portugal, “viver não custa, o que custa é saber viver”. E quem não saiba, ou pretenda não “saber viver”, pode arrumar as botas e dedicar-se à “pesca”. Ressalve-se, à pesca da “cunha”, que faz do jor-nalismo, nos dias que correm, um exercício de bajulação. Seguramente, tendo os jornalistas como principais protagonistas. Lá diz o ditado que “quem cala consente” e reconheça-se que existe um notável grau de consentimento da parte dos profissionais do sector.
Afinal, que interesses defendem os jornalistas... os do dinheiro, meu Deus, os do dinheiro, da opulência, dos chorudos salários... em agradarem ao patrão, na incerteza se terão rido suficientemente alto da anedota regurgitada da boca do chefe.
Contudo, necessário se torna saber distinguir o trigo do joio; jornalistas de “cunhistas”, investigadores de “marketeer´s”, profissionais honestos de indivíduos sem escrúpulos, explicitamente designados para exercem o ofício de censores à frente das redacções, porquanto o pouco do bom jornalismo que por vezes irradia é renegado para segundo plano, ou não chega sequer a ver a luz do dia. Não admira, pois que os Rebelos, os Vasconcelos, os Rodrigues, Sás, Cunhas e Melos, e outros que tais, levem a dianteira sobre os jornalistas nos meios de comunicação social.
Isto, não é uma novidade, é um “déja vu”.
Seguramente que a questão mereceria uma abordagem mais profunda. Poder-se-ia dissertar sobre o estado da arte, do ensino, da legitimidade dos detentores dos meios de comunicação, da deontologia da profissão, do estatuto da carreira, da Lei da Imprensa, enfim todo um conjunto de condicionalismos que obstam ao digno exercício da profissão. E para quê... Será que está na mão dos cidadãos, tão-pouco na dos jornalistas, alterar este estado de coisas. Quanto a isto, na medida do possível, devemos malhar no ferro frio, na esperança de, com esforço e pertinácia, ele ir aquecendo até o pôr ao rubro e em condições de ser moldado no formato do instrumento que todos necessitamos de utilizar na nossa vida quotidiana.

Come e cala
Cada um tem aquilo que merece, lá diz o ditado popular, não querendo com isto de modo algum desprestigiar o honorabilíssimo público que paga os jornais, faz os “shares” e limpa o rabo às folhas de papel dos periódicos. Seguramente, há OCS que nem para isso servem e cujo papel, tão ordi-nário quanto o conteúdo que encerram, é passível de provocar sérios problemas hemerroidais.
Porquanto se considere não ser este o local apropriado para debater o es-tado da censura em Portugal, o VM atreve-se contudo a lançar algumas achas para a fogueira, estimando que esta achega possa contribuir para um melhor esclarecimento dos leitores.
Se não, vejamos: actualmente, cerca de metade dos profissionais do sector estão no desemprego, ou exercem uma outra qualquer actividade que nada tem a ver com a sua formação de base. Em contrapartida, as redac-ções estão pejadas de estagiários - cujo trabalho não é remunerado -, de advogados, médicos e “especialistas”, disto e daquilo, cuja única e verdadeira especialidade é saberem mexer-se no sistema e disporem de uma base de apoio suficientemente ampla que lhes permite ostensivamente coleccionarem tachos, e não só.
Aos profissionais da comunicação, quanto muito, preocupa-os a eventualidade de poderem não ser remunerados no fim do mês, ou ficarem no desemprego, à mercê de um mercado onde a oferta supera largamente a procura, num país onde a idade da reforma é cada vez mais avançada e a mobilidade profissional pura fantasia.
Por vício, ou fatalismo, habituámo-nos a engolir e a não refilar. A “censura” está a impor-se a vários níveis, e não só no jornalismo. Ela existe no aparelho do estado, nas autarquias, nas empresas, nas escolas, está por todo o lado, simplesmente porque os portugueses pensam primeiro com a barriga (quiçá, também com outro órgão), e só depois com a cabeça.
Por aqui vive-se literalmente de invejas. O importante não é eu estar bem, o primordial é que o meu vizinho não esteja tão bem como eu. Ele há quem chame a isto, pragmatismo.

Dividir para reinar
Num país com estas características, para reinar, é só preciso saber dividir, o que em resumo significa tão-só sa-ber explorar a invejite popular, semeando ódios e atiçando os trabalhadores uns contra os outros. As coisas vão mal no ensino, pois a culpa é dos pro-fessores que não sabem ensinar, é dos alunos que não têm capacidade de aprendizagem. O facto das escolas não oferecerem condições, quer para uns, quer para outros, em adição à incompetência da ministra, isso, são pormenores de somenos importância. As coisas vão mal na saúde, pois a culpa é dos médicos, dos enfermeiros e de toda uma cambada de profissionais do sector, uns irresponsáveis que não sabem cuidar da saúde dos portugueses. Será, mas não obstante gastam-se anualmente milhares de milhões de euros em sistemas de certificação hospitalar - verbas que enchem os bolsos dos nossos “amigos” britânicos e norte-americanos -, mas que não passam disso mesmo, “coisas para inglês ver”, enquanto os nossos doentes se arrastam penosamente pelo sistema, aguardando anos a fio por uma cirurgia, de tal modo que quando as listas de espera são actualizadas, uma boa percentagem desses pacientes já terão batido a bota.
Queres parir, vai a Badajoz; queres trabalhar, emigra; queres estudar, paga; queres reforma, querias! É assim que actualmente as coisas funcionam. E poderíamos continuar por aí fora, numa tentativa de dissecar sector a sector, esbarrando invariavelmente na mesma conclusão.
Diz-se por aí, à boca cheia, que os trabalhadores portugueses não são produtivos. É inegável que existem, entre nós, grandes deficiências a nível da formação - pudera, muitos dos dinheiros que vêm da União, destinados ao sector, terão sido parcimoniosa-mente canalizados para outros fins (entenda-se bolsos) -, mas lamentavelmente ninguém se atreve a apurar responsabilidades.

A reboque
Porém, o que é que tudo isto tem a ver com o Ourondo, interrogam-se os leitores. Também por aqui, de forma, assinalável, dividir para reinar, é o lema. Por aqui há ourondenses de pri-meira, de segunda, de terceira e de quarta categoria, e há-os até que não têm categoria nenhuma. É o país inteiro espelhado neste covão, onde não basta querer viver, mas sobretudo é indispensável “saber viver”.
Eu, ourondense, me confesso: “Circundai os prepúcios, disse o Senhor. Lambei a graxa dos sapatos do patrão”. Por aqui, anda-se literalmente a reboque do país real e ufano, ao ponto de se tornar difícil destrinçar se é o poder local a copiar as bandalhices do poder central, ou os sediados do Terreiro do Paço a decalcar, a papel químico, as canalhices do caciquismo raquítico instalado no coração do rectângulo.
Decididamente, jamais haverá justiça neste covão de barganhos e bufarinheiros, apêndice de um país à beira do desmoronamento.
À parte isto, continuamos a ir à bola, com o ícone da Sra. de Fátima numa das mãos e o garrafão de vinho na outra.
É o Fado de ser-se português. Por aqui, a tradição, ainda é o que era.